Terra a Vista! 17/02/2011


Nos últimos dias do mês de janeiro, começamos a rumar de volta à Nova Zelândia, confiantes de que os outros navios da frota encontrariam o navio-fábrica durante o afastamento do Steve Irwin para reabastecimento com combustível e suprimentos para toda a frota. O navio arpoeiro continuava nos seguindo, mas a tarefa agora era chegar ao porto, sem expectativa de embates no trajeto. Quanto mais ele nos seguisse, melhor para a campanha, pois estando ocupado com essa tarefa ele não estaria caçando. Com o clima mais tranquilo, fui dispensado das minhas funções na Ponte de Comando. Passei a ajudar em algumas tarefas do Deck pela manhã e no período da tarde trabalhei em desenvolver um manual de nutrição vegetariana para a equipe da cozinha. O objetivo foi delinear algumas diretrizes para serem usadas pelas equipes das cozinhas de todas as embarcações da Sea Shepherd de modo a oferecer um cardápio equilibrado à tripulação. A alimentação a bordo do Steve Irwin é bastante adequada do ponto de vista nutricional. A única falha é a falta de alimentos frescos, mas isso é uma restrição inerente às particularidades dessa operação, onde a disponibilidade de alimentos frescos está atrelada à duração de tempo durante a qual o navio fica distante do porto. A cozinheira chefe do Steve Irwin já tem 6 anos de experiência a bordo e com isso aprendeu a oferecer um cardápio equilibrado mesmo nessas condições, planejando bem as compras e administrando muito bem as restrições que são peculiares à campanha. Portanto, esse manual não seria essencial ao Steve Irwin pelo que pude observar nessa campanha específica, mas não sei dizer o que acontece nas cozinhas das outras embarcações e como foi ela quem solicitou a confecção do manual, a necessidade deve existir de alguma forma.

Pizzas veganas com "frios" e "queijo" vegetais
Conforme afirmei, não havia expectativa de enfrentamento por esses dias, mas foi no dia 29 de janeiro que nós da equipe do Deck fomos acordados às 4 horas da manhã para nos apresentarmos ao convés com urgência. Como não dá tempo de informar o motivo e a minha cabine fica bem ao lado da escada que dá acesso à área do convés onde deveríamos nos apresentar, pulei da cama e fui ver do que se tratava antes de colocar a roupa apropriada. Estava nevando e eu, curioso, vestindo somente uma blusa, tratei de apurar logo para poder retornar e me trocar. Fui até a borda direita do navio para poder enxergar mais à frente. Para a minha surpresa, o navio arpoeiro Yushinmaru estava a cerca de 200 metros do Steve Irwin – eu nunca o havia visto de tão perto e ele manobrava de maneira feroz! Foi o tempo de eu exclamar um palavrão básico antes de virar as costas e correr escada abaixo até a sala onde ficam armazenadas as roupas usadas durante o combate. Com essa proximidade do navio e seus canhões d’água, ninguém quer estar sem a roupa de proteção.



Uma vez que estávamos todos uniformizados e reunidos no convés, o Yushinmaru havia ganhado distância. Estávamos em meio a um grande campo de growlers. Até aquele momento, eu havia dormido poucas horas por causa do barulho constante dos growlers que raspavam no casco do navio (a minha cabine fica em uma posição crítica para receber o impacto dos growlers bem em sua parede, sendo a mais próxima da proa e estando no mesmo nível da água). O que ocorreu foi que, momentos antes, o Yushinmaru nos perdeu de vista por causa da neve e da neblina e ao mesmo tempo nós reduzimos a velocidade por causa dos growlers. Tendo detectado o Yushinmaru a uma distância muito pequena na traseira do Steve Irwin, o Capitão Paul Watson foi chamado à Ponte e decidiu realizar uma manobra de 180 graus, resultando nessa aproximação tão curta do navio arpoeiro naquele primeiro momento quando fomos chamados. Mas por fim o navio arpoeiro se afastou e toda a movimentação não passou de um bom aquecimento matinal, que foi finalizado com um exercício de lançamento de bolas de neve em alvos imaginários no imenso oceano. Poucas horas depois começaria a rotina normal de trabalho no Deck, sem folga ou atraso mesmo em situações excepcionais como a dessa madrugada com a adrenalina correndo nas veias.



Depois de ter recebido como presente de Natal a oportunidade de estar a bordo e como presente de Ano Novo a localização da frota japonesa, o dia 02 de fevereiro parecia prometer uma surpresa mais para marcar o meu aniversário. Eu desejava receber como presente a localização do navio-fábrica, mas não foi assim que aconteceu. Eu geralmente escolho estar em algum lugar distante das pessoas e próximo à natureza no dia do meu aniversário. Paradoxalmente, apesar de eu estar no lugar mais distante onde já estive (a milhares de quilômetros de casa e com uma densidade demográfica que, em um raio de várias centenas de quilômetros, resumia-se às 44 pessoas a bordo do Steve Irwin e algumas outras mais a bordo do Yushinmaru que nos seguia logo atrás), eu me encontrava em uma situação onde não seria possível evitar estar com outras 43 pessoas em um espaço bastante limitado (risos). Foi realmente um aniversário especial, o qual passei na companhia de pessoas que escolheram abrir mão do seu conforto e da sua segurança, colocando suas vidas em risco pela preservação da vida e do planeta. Seria difícil estar em melhor companhia. Ganhei um bolo com cobertura de morango (em conserva) e recebi os parabéns em vários idiomas.





Outro fato inusitado sobre o meu aniversário desse ano é que ele durou apenas 4 horas. Isso mesmo, o dia 02 de fevereiro desse ano teve apenas 4 horas de duração para a tripulação. Explico. O meridiano dos 180 graus, que fica diretamente oposto ao meridiano de Greenwich (zero grau), marca a mudança de data. Ele fica logo à direita (ao leste) da Nova Zelândia, onde não há muito mais terra em meio à vastidão do Oceano Pacífico. O dia começa ao leste do meridiano 180 e termina a oeste do mesmo. Ou seja, se você estiver ao oeste dessa linha e rumar ao leste, cruzando-a, você se mantém no mesmo horário, só que do dia anterior. Se cruzar a linha na direção oposta, o oposto acontece, voltando ao mesmo horário, só que do dia seguinte. Em um dado momento, enquanto rumávamos em direção ao oeste estando ao leste do meridiano 180, estávamos num ponto onde a rigor seriam 8 horas da noite do dia 01 de fevereiro. Ao atravessarmos o meridiano 180, em um mero instante já estávamos às 8 horas da noite do dia 02 de fevereiro. Ou seja, o dia acabou 4 horas depois de ter começado! Sorte não ter mudado o curso nas próximas horas, ou eu poderia ter envelhecido mais um ano. Com sorte, nesse ano terei envelhecido apenas um oitavo de ano (risos).

Nos últimos dias da campanha, o Steve Irwin nos levou a uma distância de cerca de apenas 1.000 milhas do Pólo Sul, ou apenas 300 milhas ao norte do ponto mais ao sul onde o oceano pode chegar, onde ele encontra o continente Antártico em seu trecho mais curto. Isso significa dizer que com mais um dia de navegação teríamos chegado ao ponto mais ao sul do nosso planeta ao qual um navio pode chegar. No dia 04 de fevereiro recebemos a notícia de que Gojira e o Bob Barker haviam conseguido despistar o navio arpoeiro que os seguia, aumentando assim as suas chances de encontrarem o navio-fábrica. Receber uma boa notícia como essa no momento em que estamos distantes do foco da ação é muito reconfortante.



No final da tarde do dia 05 de fevereiro avistávamos a terra firme! Depois de 46 dias olhando para a vastidão do oceano por pelos menos 8 horas diárias, durante os quais a única porção de terra com um vegetal vivo ao alcance dos olhos se resumia a um vaso de salsão que ornamentava o fogão da cozinha (sim, essa era a única planta a bordo), vejo surgir no horizonte um trecho da Ilha Sul da Nova Zelândia. É indescritível a sensação que experimentei ao ver terra firme depois de ter passado tanto tempo distante dela e é comovente a clareza da percepção sobre o quanto somos delicadamente dependentes do nosso habitat. Depois de 46 dias a bordo de um navio em situação de combate na região mais inóspita do nosso planeta, a minha percepção de conexão com o planeta ganha uma nova clareza, em especial no que diz respeito à nossa fragilidade frente à sua força, que ao mesmo tempo em que molda a possibilidade da nossa co-existência, é também a mesma força capaz de nos exterminar sem muito esforço ou explicação.



Chegamos ao porto ao entardecer e ganhamos uma recepção calorosa dos ativistas locais, que nos aguardavam com faixas e muitos gritos de incentivo. E nos aguardavam com o melhor presente que poderíamos desejar naquele momento: frutas frescas! Ou melhor, FRUTAS FRESCAS (com letras maiúsculas). Não me dei conta do momento em que elas foram içadas a bordo, antes mesmo de o navio estar firmemente atado, mas eu estava presente no momento em que elas foram impiedosamente devoradas ali mesmo sobre os barris de combustíveis.


Frutas frescas com petróleo! Hummm!!!


Tendo deixado o navio, fiquei mais quatro dias na Nova Zelândia aguardando a data do meu voo de retorno ao Brasil. A Nova Zelândia é um grande acidente geográfico! Um trecho de terra com fauna e flora únicas e exuberantes. Conversando com alguns dos tripulantes neozelandeses, eu havia programado algumas coisas para ver e fazer durante esses quatro dias. Mas antes de qualquer outra coisa, havia uma que precisava ser feita. Encontrar frutas e vegetais frescos. Sim, mais, pois aqueles da recepção não foram suficientes para apaziguar os tantos dias de privação dessas maravilhas alimentares. mas para conseguir as frutas, eu teria que atravessar uma selva de pessoas, de sons e de luzes. A poucos metros do porto onde atracamos há um estádio e naquele momento acabava a partida final de um campeonato internacional de rúgbi. Havia muita gente nas ruas. Naquele momento, qualquer número acima de 44 pessoas seria equivalente a muitas pessoas, e havia centenas de grupos de 44 pessoas por todos os lados, mesmo no porto, onde as pessoas se reuniam nos bares ali instalados para celebrar fantasiadas como quem vai a uma festa à fantasia (por algum motivo eles se fantasiam para ir aos jogos). Extraterrestres, bruxas, fadas, duendes e toda sorte de seres humanos e não-humanos, terráqueos ou não, foram a primeira visão ao desembarcar. Com duas mochilas nas costas, o corpo cansado, a experiência fresca e a mente em adaptação e sem localização, os pensamentos mais estranhos passavam pela minha mente ao me encontrar inserido naquela cena surreal onde centenas de pessoas celebravam freneticamente enquanto eu dava os primeiros passos em terra firme e procurava me adaptar às vozes, às luzes, aos sons, à falta do balanço do navio, a tantas coisas que eu nem me dava conta.


Apenas a minha determinação por encontrar frutas e vegetais frescos foi capaz de me ajudar a sobreviver ao episódio (risos). Logo cheguei a um supermercado. Bem ali na entrada estava a visão do paraíso, clara como nenhum poeta jamais foi capaz de descrever. Cores vivas, texturas macias e sabores frescos. Também me chamaram a atenção algumas flores e outras plantas que estavam por ali. Cheirei as flores, acariciei as plantas e enchi um cesto de vegetais e frutas frescas que foram devorados durante os próximos quatro dias, durante os quais não comi qualquer outra coisa além desses alimentos crus. Feliz, caminhei entre as fadas e extraterrestres, comi, tomei um longo banho que durou mais que 3 minutos e dormi (inclusive, dormi parte dentro do banho), dormi muito.






Durante esse quatro dias em que pude explorar brevemente a Ilha Norte desse país, tive a certeza de que desejo voltar a essa região do planeta em um futuro próximo, talvez com outra forma de atenção. Dessa vez, as coisas mais simples como uma flor ou a própria terra (o chão mesmo) eram motivo de alegria e prazer. Visitei jardins botânicos (coisa que eu jamais havia feito em uma viagem) para poder estar em contato com as plantas, caminhei descalço por florestas para sentir o chão firme e úmido sob os meus pés. Mas as alegrias não se resumiam a terra e plantas. Também usei o telefone e respondi e-mails (centenas deles), que foram outras coisas das quais eu estive privado enquanto estava a bordo (eu apenas tinha permissão para enviar textos previamente monitorados, mas para receber notícias), agora notando o quao ricas são essas ações que costumo tomar como sendo triviais.

No dia do meu embarque para o Brasil veio a melhor notícia que eu poderia ter recebido antes de deixar a Nova Zelândia: o Gojira havia localizado o navio-fábrica! Era o fim da temporada de caça para a frota baleeira japonesa. Hoje, dia 17 de fevereiro de 2011, oito dias depois da localização desse que é o coração da frota baleeira, o governo japonês ordenou que os navios retornassem ao porto no Japão e foram bem claros ao declarar o motivo de antecipado o retorno para mais de um mês antes do previsto: “Não é possível caçar na presença da Sea Shepherd!”. A frota baleeira voltou para casa com menos de 15% da sua cota auto-estabelecida de 1.000 baleias. Isso significa que mais de 850 baleias continuam nadando livres nos oceanos graças à intervenção realizada pela Sea Shepherd com o apoio de seus voluntários e colaboradores.



Mesmo diante de todas as adversidades e riscos enfrentados, esse resultado é tudo o que importa. A frota baleeira não caçou no início da temporada quando a localizamos no dia 31 de dezembro, caçou em ritmo reduzido em momentos posteriores e, 40 dias depois, o governo japonês ordena o seu retorno ainda na metade da campanha. Esse resultado (que é um resultado pequeno diante da obrigação ética e dívida histórica que temos com esses animais) atesta para o valor do empenho que cada um pode dedicar em ações que, por mais que em um determinado momento possam ser extremamente desgastantes ou parecer improdutivas, acabam por render frutos que são muito gratificantes para os animais que deles usufruirão.

Quero concluir essa série de relatos dizendo que não foi fácil desembarcar do Steve Irwin no meio da campanha. Ou mesmo que tivesse sido no final dela. Na verdade, acredito que não tenha deixado completamente, tanto o navio quanto as pessoas com quem tive a oportunidade de conviver durante esses 46 dias. Deixei o Steve Irwin com a certeza de que sentiria falta de tudo o que ali ficava: a rotina, os espaços, as pessoas, os bons e os maus momentos da convivência que nem sempre foi fácil, ainda mais quando ela dura por tanto tempo e fica confinada a um espaço que é menor que o próprio tempo, mas ainda assim consegue ser rica o tempo todo... e que deixa saudades. Mas eu não sentirei falta da experiência, pois essa eu trago comigo. Trago também o aprendizado, as aventuras, a realização do trabalho e as conquistas, essas que não podem ser comemoradas por aqueles que se beneficiarão delas, mas que serão usufruídas mesmo sem saberem que elas aconteceram. Para mim, essas são as melhores conquistas que podem haver, aquelas cujos resultados não podem ser medidos (e justamente por isso dispensam celebração) e que apesar de não trazerem qualquer benefício a quem as viabilizou, garantem benefícios duradouros a quem delas usufruirá.
  


Tendo participado de mais essa expressão de ativismo pelos direitos animais, a via da ação direta não-violenta, convoco a todos a deixarem a sua zona de conforto e colocarem-se a fazer aquilo que acreditam ser justo e necessário para a preservação da vida e a defesa do planeta.



Entrevista com George Guimarães

Entrevista concedida no final de janeiro de 2011 enquanto estava a bordo do Steve Irwin:

1- Quando surgiu a ideia de integrar a tripulação de um navio da Sea Shepherd? Você é membro do grupo desde quando? E quanto tempo deve ficar no navio?

O meu primeiro contato com a Sea Shepherd foi em 2005 quando conheci o Capitão Paul Watson em uma conferência de direitos animais nos EUA, onde palestramos juntos. Desde então, pude conhecer mais sobre o grupo e a eficiência do seu modo de ação e em 2009 me inscrevi como voluntário para participar da campanha contra a caça de baleias na Antártida, o que se concretizou em dezembro de 2010. Nesse ano, a frota da Sea Shepherd é composta por três embarcações e patrulhará a região até o mês de março. Algumas das embarcações precisam retornar ao porto (que pode estar a uma distância de alguns dias até mais de uma semana) para reabastecimento. Eu ficarei no navio até o momento do reabastecimento, que depende do desempenho do navio durante a campanha e por isso não pode ser previsto com muita antecedência. Poderei ficar a bordo entre 6 e 12 semanas.

2- Para que lugares você deve ir com o navio? Qual é o seu objetivo principal?

Estou a bordo do Steve Irwin, o principal navio da frota, que se divide com o Bob Barker e o Gojira (embarcação veloz com design futurista que bateu o recorde de volta ao mundo) na tarefa de patrulhar uma área imensa do Oceano Antártico que se estende por milhares de quilômetros de latitude e longitude, desde o sul da Nova Zelândia e em direção ao Chile até o Mar de Ross, que faz contato com o continente gelado no extremo sul do planeta.

O desafio da frota da Sea Shepherd é encontrar a frota baleeira japonesa para impedir a caça. Nesse ano, pela primeira vez, esse objetivo foi alcançado em 31 de dezembro, quando três navios arpoeiros (Yushinmaru 1, 2 e 3) foram interceptados antes que eles tivessem iniciado a caça e os temos mantido ocupados desde então, o que significa que não estão caçando. O alvo maior é encontrar o navio-fábrica (Nishinmaru), onde as baleias mortas pelos navios arpoeiros são processadas. Quando o navio-fábrica é encontrado, a sua rampa de carregamento é obstruída pela nossa presença e os navios arpoeiros param de caçar pois não podem fazer a transferência da baleia morta por eles. De qualquer modo, enquanto continuamos sendo seguidos por dois dos seus navios arpoeiros, que se mantêm em nossa traseira para informar ao navio-fábrica a nossa posição para que esse possa se dirigir na direção oposta, nenhum desses está caçando.

Para completar a intervenção bem-sucedida, o navio-tanque, responsável por fornecer combustível à frota japonesa, foi interceptado no dia 11 de janeiro e prontamente escoltado para fora do Santuário de Baleias, onde jamais deveriam ter entrado já que é proibida a transferência de combustíveis abaixo dos 60 graus sul de latitude. Ele está sendo mantido à vista, o que impede qualquer tentativa de reabastecimento e por sua vez condena toda a frota baleeira a ter que retornar para casa dentro muito em breve.

Em resumo, enquanto a Sea Shepherd está presente, seja perseguindo-os ou sendo perseguida por eles, eles não têm a possibilidade de caçar.

3- A Sea Shepherd costuma ir de encontro a navios baleeiros e atacá-los. Prefere que os japoneses briguem com eles e, enquanto isso, não matem baleias. Mas não é uma atividade perigosa? No ano passado, um navio do Sea Shepherd se chocou contra um baleeiro - não houve feridos, mas o casco do barco rasgou. Não teme o que pode ocorrer?

Na verdade, a Sea Shepherd não os ataca, mas intervém para fazer valer um tratado internacional que proíbe a caça de baleias. Uma vez que a frota japonesa reage de forma violenta, a frota da Sea Shepherd responde usando bombas de fumaça e lançando garrafas contendo ácido butírico, que nada mais é do que uma substância de odor nauseante que impede que a tripulação dos navios baleeiros trabalhe nos conveses dos navios. Ambas são inofensivas à vida da tripulação.

De fato, em um oceano de clima extremo, considerado como a área de navegação mais perigosa do planeta onde a temperatura da água é abaixo de zero grau Celsius e o porto mais próximo pode estar a muitos dias de navegação, há um grande risco inerente à atividade desempenhada por toda a tripulação. Estamos cientes desse risco e o assumimos de maneira voluntária sem esperar receber qualquer coisa em troca a não ser o resultado pelos animais e pelo planeta. Esse risco tem a sua importância reduzida quando é colocado sob a perspectiva do poder que nossas ações individuais podem ter sobre as vidas de milhares desses magníficos mamíferos que são cruelmente massacrados para satisfazer a um paladar pervertido que causa um efeito direto sobre as vidas desses animais. Além dessa consequência óbvia, há ainda o impacto sobre os seus companheiros, que testemunham de perto a morte dos que são atingidos por arpões munidos com explosivos, afogando-se em seu próprio sangue durante uma agonia que pode levar mais de 30 minutos para ser encerrada. Além disso, há ainda o efeito devastador sobre o ecossistema delicado dos oceanos, do qual depende também a nossa própria sobrevivência.

Muitas pessoas colocam suas vidas em risco por motivos menos nobres, seja para lutar pela pátria, para conquistar um país e tomar suas reservas de petróleo ou ainda por outros motivos que, por mais que estejam travestidos de sentimentos coletivos aparentemente nobres, não deixam de ser motivos egoístas na medida em que violam o interesse e o direito de outros. Diante dessa realidade histórica da nossa sociedade, onde indivíduos sempre se dispuseram ao sacrifício em nome da dominação e de sentimentos nada altruístas, confesso que tenho dificuldade em compreender por que algumas pessoas se espantam ao saberem que alguém é capaz de colocar sua vida em risco motivado por uma causa verdadeiramente nobre e que amplia a noção de coletividade para além da esfera dos animais humanos.

4- Algumas ONGs, como o Greenpeace, criticam essa estratégia de choque do Sea Shepherd. Eles defendem que os embates têm de ser pacíficos e que a vida dos integrantes do grupo nunca pode ser ameaçada. Como avalia isso? Qual é sua opinião?

O fato é que a Sea Shepherd conseguiu cortar pela metade a cota de 1.000 baleias que o Japão intentava matar no ano passado e, nesse exato momento, está aqui trabalhando para que eles voltem para casa de mãos vazias. A mesma ONG que critica essas estratégias que já se provaram eficientes promove nesse ano uma campanha para enviar origamis de baleia ao presidente dos EUA (que já é um país que não apoia a caça de baleias) e outras ações que têm pouco efeito sobre a vida das baleias que estão aqui onde nos dispusemos a vir. Tais campanhas têm um ar muito simpático (para não dizer fofo) e funcionam para trazer recursos para a ONG, mas diferentemente dos animais de papel que serão produzidos a cada doação recebida e assim serão multiplicados, têm pouca importância sobre a vida ou a morte das baleias de carne e osso que estão aqui e que estariam sendo mortas caso essa tripulação não tivesse escolhido estar aqui trabalhando e apoiando os métodos que vêm sendo usados pela Sea Shepherd nos últimos.

De qualquer forma, as ações realizadas pela Sea Shepherd não são violentas. Há uma diferença importante entre o uso da violência e o uso da força. A primeira tem como alvos seres sencientes (capazes de sentir dor e medo) que podem ser cetáceos, humanos ou qualquer outro animal. Esse é o tipo de ação levada a cabo pela frota japonesa quando lançam diretamente contra nós seus canhões de água pressurizada super gelada ou projéteis de metal. Há dois anos o Capitão Paul Watson foi baleado durante um confronto com a frota japonesa nesse mesmo navio e nessa mesma região. Já a segunda situação, o uso da força, tem como alvos objetos inanimados (navios, por exemplo) com a condição de não colocar em risco a vida da tripulação que ocupa o alvo. Todas as ferramentas usadas pela Sea Shepherd têm essa característica.

5- Como é nutricionista especializado em dietas vegetarianas e é vegano, gostaria de saber qual é a alimentação que tem no navio. É possível manter esse tipo de alimentação na embarcação?

Estamos aqui para defender vidas e o meio ambiente e nada mais coerente do que não consumirmos produtos de origem animal já que esses causam um impacto negativo sobre ambos. Por isso, toda a alimentação servida nos navios da Sea Shepherd é vegana, o que significa que não contêm carnes, laticínios, ovos ou qualquer outro produto que seja derivado da exploração de animais. Alguns tripulantes estão a bordo há meses e, assim como os veganos que estão em terra, são o testemunho vivo de que uma alimentação vegetariana atende à demanda física que a vida a bordo exige em uma campanha como essa.

6- O que mais considera importante ressaltar?

Os leitores podem encontrar informações sobre a campanha atualizadas semanalmente e relatadas a partir do meu ponto de vista no endereço http://guerragelida.blogspot.com

Sim, acabou!

18 de fevereiro de 2011

Hoje é um grande dia para as baleias!

Agora é definitivo. Hoje, 18 de fevereiro, o governo do Japão ordenou que os navios retornassem ao porto no Japão!

Depois de décadas de matança de dezenas de milhares desses magníficos animais, hoje é o dia em que a caça de baleias no Santuário Antártico terminou!


Notícia publicada hoje no R7: http://noticias.r7.com/internacional/noticias/japao-suspende-caca-as-baleias-na-antartida-20110218.html

Nota: O governo japonês deixa claro que o motivo do abandono da caça são as ações da Sea Shepherd (o que seria inegável).

Japão suspende caça às baleias na Antártida

País alega dificuldade de proteger seus navios de entidades ecológicas

Japão decidiu suspender sua campanha de caça às baleias na Antártida até o final da atual temporada, informou nesta sexta-feira o ministro da Agricultura e Pesca, Michihiko Kano. O anúncio foi feito via a TV estatal NHK.

- O ministro disse que a campanha será suspensa devido à dificuldade de se garantir a segurança das tripulações diante do assédio incessante da Sea Shepherd.

A Sea Sheperd é uma organização ecológica que, com navios próprios, ataca os pesqueiros japoneses, danificando suas estruturas e impedindo-os de caçar os mamíferos marinhos.

A Agência de Pesca já havia anunciado, na quarta-feira, a suspensão das atividades do Nisshin Maru, navio-fábrica da frota baleeira, por questões de segurança.

As capturas da frota japonesa, que tem uma cota anual de cerca de mil cetáceos, foram de apenas 507 baleias no ano passado, fato que a Agência de Pesca atribuiu às atividades de "obstrução" da Sea Shepherd.

Captura proibida

O Japão caça anualmente centenas de baleias na Antártica em nome da "pesquisa científica", já que a captura comercial do cetáceo está proibida desde 1986.

A baleia jubarte, principal alvo dos perqueiros, é uma espécie ameaça de extinção. estima-se que existam cerca de 35 mil desses animais, somando-se todos os oceanos.

 As autoridades japonesas afirmam que o consumo de carne de baleia é uma tradição ancestral no arquipélago.

Na última segunda-feira (14), o denominado "grupo de Buenos Aires", integrado por Argentina, Brasil, Chile, Costa Rica, Equador, México, Panamá, Peru e Uruguai, pediu ao Japão que ponha fim à "caça científica" de baleias.


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Acabou?

Japoneses anunciam a possibilidade de voltarem para casa mais cedo

Japoneses anunciam a possibilidade de sair de vez da Antártida e atribuem o motivo à ação da Sea Shepherd, que fez com que conseguissem matar menos de 10% dos animais que pretendiam.
Como a Sea Shepherd está na traseira do navio-fábrica, o que impede a atividade de caça, a matança está suspensa e um membro do governo japonês anunciou que nesse momentoestão estudando a possibilidade de trazer a frota de volta 

Tudo pode ser mudado. Basta agir!

17 de fevereiro de 2010

Notícia do jornal O Estado de São Paulo:http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20110217/not_imp680597,0.php

O Japão decidiu suspender temporariamente a caça de baleias na Antártida. O país alega que os tripulantes dos navios baleeiros estão em risco por causa da perseguição e dos ataques feitos pela ONG Sea Shepherd - os japoneses dizem que os ativistas têm agido de forma violenta.

Apesar de a caça ter sido proibida em 1986, os japoneses têm permissão para fazer o que chamam de caça científica. Neste ano, tinham o direito de caçar 945 baleias para realizar pesquisas, mas ficaram abaixo da cota. A carne das baleias mortas pode ser vendida no mercado interno. Segundo Tatsuya Nakaoku, da agência de pesca japonesa, a caça deve ser retomada quando as condições forem consideradas mais seguras. Porém, ele não informou por quanto tempo a suspensão deve ser mantida. O Sea Shepherd comemorou a decisão. "Deviam ter suspendido há 10, 15 anos. É moralmente e legalmente errado matar baleias", afirma Grant Pereira, ligado à ONG.

O brasileiro George Guimarães, nutricionista e defensor dos direitos dos animais, participou dessa campanha do Sea Shepherd. "É gratificante ver o resultado do trabalho", diz. Ao encontrar e conseguir bloquear o navio da frota, Nisshin Maru, a ONG impediu que os japoneses continuassem caçando. "Na campanha passada já tiveram prejuízo. Nesta, será ainda maior. Não vale a pena manter a tripulação na Antártida sem conseguir caçar."


Veja abaixo a notícia do Sky News da Austrália:


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Japanese whalers have suspended their Antarctic hunt and are considering ending their mission early, a fisheries official says.
Activists from the US-based militant environmental group the Sea Shepherd Conservation Society have pursued and harassed the Japanese fleet for months to stop its harpoon ships from killing the sea mammals.
'(The factory ship) the Nisshin Maru, which has been chased by Sea Shepherd, has suspended operations since February 10 so as to ensure the safety (of the crew)', Japanese Fisheries Agency official Tatsuya Nakaoku said.
'We are now studying the situation, including the possibility of cutting the mission early,' he told Agence France-Presse in Tokyo, confirming media reports, but stressing that 'nothing has been decided at this point'.

Achados e Perdidos 26/01/2011

O helicóptero iniciou a busca pelo navio-fábrica, o Nishinmaru, logo cedo às 5 horas da manhã do dia 25 de janeiro. A área na qual estávamos posicionados estava tomada por imensas placas de gelo, o que é bom porque permite que o helicóptero voe com mais frequência já que a presença do gelo reduz as ondulações, o que é importante para a estabilidade do navio de modo que o helicóptero possa decolar e pousar. A parte não tão boa é que o Steve Irwin fica mais sujeito a se chocar contra um pedaço de gelo maior do que o seu casco pode suportar. Como já foi mencionado anteriormente, diferentemente do Bob Barker, o Steve Irwin não é um navio projetado para navegar no gelo já que o seu casco não tem a resistência necessária para se chocar contra blocos de solidez semelhante ao concreto e que podem ser maiores que uma casa. Esse é o caso dos blocos de gelo conhecidos como growlers. Já as placas de gelo podem ter centenas de metros de extensão. Nas condições de clima e distância da civilização nas quais estamos, uma abertura no casco pode resultar em uma fatalidade para toda a tripulação.

Foto por George Guimarães

Enquanto o Bob Barker continuava a manter o navio-tanque ocupado a alguns dias de navegação ao norte, o Steve Irwin passou o dia rasgando as imensas placas de gelo e esquivando-se dos growlers que minavam o oceano ao nosso redor. Foi o dia mais tenso de observação de growlers, especialmente porque tínhamos que reduzir em muito a velocidade para decolagem, o que reduz a capacidade de manobra. O helicóptero decolou repetidas vezes durante o dia usando a sua capacidade de se deslocar muitas vezes mais rápido que o Steve Irwin para varrer a região. Outra vantagem é que, diferente do navio, o helicóptero pode ver o alvo sem necessariamente ser visto, pois o contato visual é feito de longe e a sua velocidade dificulta que ele seja detectado no radar.

Depois de ter coberto centenas de milhas náuticas, foi no final da tarde que escutei pelo rádio enquanto descansava na Mess (área de descanso referida no texto do dia 16/01): “O helicóptero conseguiu confirmação visual do Nishinmaru”. As reações  variaram entre a euforia e a perplexidade. Logo seria o meu turno na Ponte e eu poderia acompanhar todos os detalhes, mas não dava para esperar, não é? Muitos correram para a Ponte de Comando para saber mais e possivelmente conseguir ver o navio, preparar-se para a ação... Mas o que descobrimos foi que o navio-fábrica estava a 35 milhas de distância, ainda muito distante para ser alcançado. O importante é que sabíamos onde ele estava. Agora seria uma questão de uso de estratégia para que pudéssemos alcançá-lo.
Foto por Barbara Veiga
Nishinmaru visto do helicóptero

O navio arpoeiro (Yushinmaru) que estava próximo ao navio-fábrica (Nishinmaru) não demorou a localizar o Steve Irwin e assim passou a nos monitorar, o que tornaria mais difícil a nossa aproximação. Em uma área tomada por icebergs e growlers, o radar do Steve Irwin não é capaz de detectar um navio a uma distância grande. O Nishinmaru, por outro lado, sabia exatamente a nossa posição uma vez que o Yushinmaru passou a nos seguir. Por isso dependíamos do helicóptero, que continuava a decolar de tempo em tempo para assegurar o conhecimento da posição do navio que é o coração da frota baleeira japonesa.

Foto por George Guimarães

Em torno das 8 da noite, em um ato desesperado objetivando dificultar  a   nossa   aproximação, que agora já tinha uma distância reduzida, o navio-fábrica passou a rumar em meio a um grande campo de gelo. As fotos aéreas produzidas a bordo do helicóptero mostravam que o Steve Irwin não poderia navegar pelo mesmo campo. Na verdade, nem eles poderiam, já que o Nishinmaru também não é adaptado para a navegação em meio ao gelo denso. Escolhemos dar a volta para cercá-los pelo outro lado do campo de gelo (uma área que se estendia por centenas de milhas). Com a equipe do helicóptero e do Deck extremamente desgastada (devido ao risco de um acidente durante a decolagem e o pouso e a velocidade com que deve ser efetuado o resgate, a equipe do Deck coloca o barco Delta de prontidão cada vez em que o helicóptero decola ou pousa) por estar trabalhando ininterruptamente desde as 5 da manhã, o monitoramento aéreo teve que ser cancelado por volta da meia-noite para ser retomado logo cedo no dia seguinte. Por mais que todos desejassem continuar, qualquer erro na operação pode causar uma fatalidade e as mentes já não mais conseguiam estar tão atentas quanto se fazia necessário.

Foto por Barbara Veiga

No dia seguinte, não pudemos mais localizar o navio-fábrica. O Gojira, que estava na Austrália para reparos no motor, fez uma enorme falta nesse momento da ação, pois ele teria sido capaz de contornar o campo de gelo com grande rapidez para encontrar o navio-fábrica do outro lado. Também fez falta o Bob Barker, que há poucos dias havia deixado de perseguir o navio-tanque mais ao norte para poder se juntar ao Steve Irwin em nossa busca ao sul, mas ele estava a alguns dias de distância. Foi efetuado o lançamento de um balão meteorológico com câmera e radar para auxiliar na busca, mas as informações colhidas não mostraram a presença do navio-fábrica na região. Com o navio arpoeiro em nossa traseira, sem conhecer as coordenadas antes detectadas pelo helicóptero, e navegando em meio ao grande campo de gelo, nossas chances de encontrá-lo estavam muito reduzidas.


Foto por George Guimarães
Barco Delta lançado à água
Nesse momento, deu-se início a uma operação de caça para afastar o navio arpoeiro. O barco Delta foi lançado à água com a munição necessária (ácido butírico, bombas de fumaça, cordas para apreender a hélice do navio arpoeiro), o helicóptero ao ar e o canhão d’água foi posicionado. Como não era o horário do meu turno na Ponte, uni-me à equipe do Deck para estar mais próximo da ação. Ao perceber nossa manobra de aproximação, o navio arpoeiro passou se dirigiu para o meio do gelo, o que impossibilitou a aproximação do barco Delta devido à sua limitação de navegação no gelo (trata-se de um barco feito de material flexível). O Steve Irwin seguiu em meio ao gelo, que era manchado com a tinta vermelha arrancada do casco do navio. O barulho do impacto é impressionante, assim como é impressionante ver uma massa flutuante pesando dezenas de toneladas rachando sobre os seus pés. A esperança era que, ao fugir em meio ao gelo, o navio arpoeiro se encurralaria em um trecho onde não conseguiria passar. A Sea Shepherd tem a vantagem do helicóptero que possibilita a visão aérea, já a frota baleeira não conta com essa vantagem. Por isso, a chance do navio arpoeiro se encurralar era maior do que a chance de o Steve Irwin ser encurralado. No entanto, eles seguiram gelo adentro. Como a capacidade de velocidade do navio arpoeiro é maior que a do Steve Irwin, abandonamos a perseguição depois de cerca de uma hora e voltamos a buscar pelo navio-fábrica, que é o melhor que podemos fazer nesse momento.

Foto por Barbara Veiga
Yushinmaru cortando o gelo

Juntamente com a notícia boa que o helicóptero trouxe ontem, a da descoberta do navio-fábrica, veio também a notícia ruim de que ele havia detectado a presença da carcaça de uma baleia no convés do navio assassino. A essa altura, já esperávamos que um dos três navios arpoeiros estivesse caçando (os outros dois estavam ocupados perseguindo a nossa frota), apesar de esse único arpoeiro estar caçando pouco, pois sabia da nossa presença na região e estava procurando manter a distância. Como sempre, se estão fugindo, não estão caçando. Portanto, já sabíamos da possibilidade de esse único navio estar atuando. Ainda assim, para nós que estamos aqui dedicando o nosso tempo e colocando nossas vidas em risco é ao mesmo tempo frustrante e revoltante saber que uma baleia foi morta enquanto estamos tão próximos. Estão matando algumas baleias ao invés de estarem matando centenas de baleias, o que é bom, mas para essas algumas que foram mortas, essa redução estatística não faz a menor diferença.

Os outros navios da frota da Sea Shepherd não deverão demorar a chegar à região onde estamos buscando e, quando isso acontecer, deveremos rumar de volta ao porto para reabastecimento, pois nossas reservas de combustível e suprimentos se aproximam do limite. Em toda a história da Sea Shepherd, esse foi o período mais longo de navegação do Steve Irwin – hoje contamos o 36º dia desde que deixamos o porto no dia 22 de dezembro e ainda temos alguns dias pela frente. Não temos mais frutas ou vegetais frescos (já estou começando a considerar pêssego em calda como uma “fruta fresca”, pois é o mais próximo a isso que temos em estoque), o banho está restrito a um banho de 3 minutos a cada 3 dias e a rotina começa a afetar o ânimo de todos. Sobre isso, eu escreverei no próximo texto. Nas últimas 24 horas tivemos momentos de alegria quando encontramos o Nishinmaru e de tristeza quando o perdemos. O que nos anima é saber que apesar de não estarmos conseguindo uma eficiência de 100% na redução da caça, ela foi reduzida em pelo menos 70% (eu também explicarei esses números no próximo texto).

Foto por George Guimarães
Yushinmaru em fuga para o meio do campo de gelo

Foto por George Guimarães
Barco Delta tenta aproximação

Foto por George Guimarães
Campo minado

Foto por George Guimarães
Campo minado 2

Foto por George Guimarães
Perseguição em meio ao campo de gelo

Foto por George Guimarães
Cortando pelo campo minado

Foto por George Guimarães
Cortando pelo campo minado

Foto por George Guimarães
Blocos de gelo partidos pelo navio


 Vídeo do Nishinmaru no momento em que foi encontrado (vídeo obtido no site da Sea Shepherd http://www.seashepherd.org/):



Fuga Tempestuosa 22/01/2011

Nos últimos dias, a rotina foi quebrada de maneira intencional e não-intencional (ou semi-intencional). Alguns membros da tripulação realizaram oficinas para compartilhar o seu conhecimento. Uma das engenheiras explicou sobre o funcionamento do seu setor (motores, geradores, etc), descrevendo os equipamentos e procedimentos em caso de emergências, como um incêndio, por exemplo, o que requereria a entrada da brigada de incêndio e por isso a necessidade de nos familiarizarmos com o ambiente e equipamentos desse setor. As explicações foram completadas por uma visita em pequenos grupos a esses ambientes que geralmente têm o acesso restrito ao restante da tripulação. Ficamos tão felizes com a “excursão” que outras oficinas foram propostas. Um tripulante experiente ensinou a todos sobre noções básicas de navegação (cartas, instrumentos, cálculos) e eu fiz uma oficina sobre nutrição vegetariana.

Foto por George Guimarães
Oficina Engenheira Beth

Foto por George Guimarães
Tripulação assistindo às oficinas

No dia 17 de janeiro o navio-tanque continuava a ser escoltado para garantir que ele não reabasteceria a frota baleeira. Os dois navios arpoeiros continuavam nos acompanhando bem ao norte da região do Tratado Antártico, deixando a certeza de que não estariam caçando. Mas o navio arpoeiro e o navio-fábrica continuavam incógnitos em sua localização e poderiam estar caçando mais ao sul.

A estratégia da frota japonesa é a de despistar a frota da Sea Shepherd do rastro do navio-tanque enquanto busca preservar o rastro que mantinha no Bob Barker e no Steve Irwin usando os navios arpoeiros. Assim, teriam o navio-tanque livre para reabastecer o navio-fábrica e poderiam mantê-los a uma distância segura na medida em que os navios arpoeiros informariam a posição dos navios da Sea Shepherd que continuariam a ser seguidos. Já a estratégia desse lado era a de perder um dos navios arpoeiros para poder ir procurar o navio-fábrica enquanto o outro navio continuaria escoltando o navio-tanque.


Foto por George Guimarães
Ondas pela lateral traseira do Steve Irwin

Foto por George Guimarães
Onda atinge lateral do Steve Irwin

Foto por George Guimarães
Onda atinge a proa do Steve Irwin

Foto por George Guimarães
Onda gigantesca se aproxima pela lateral


Foto por George Guimarães
Bob Barker em meio à tempestade

O Steve Irwin balançava de maneira severa, tombando mais de 30 graus para cada lado. A situação no Bob Barker, que estava ao alcance da nossa vista nos momentos em que a tempestade permitia, era ainda pior, pois a sua estrutura faz com que ele balance ainda mais quando atingido por ondas pela lateral. A bagunça no interior do navio era grande conforme os objetos, por mais bem amarrados que estejam o tempo todo, se deslocavam pelos vários ambientes do navio. Cadeiras, pratos, pessoas, tudo era jogado para lá e para cá. Na Ponte de Comando, que fica em uma posição mais elevada no navio e por isso balança ainda mais, balançávamos tão intensamente quanto os objetos que ocupavam (e desocupavam) as bancadas. As ondas chegaram a 12 metros de altura, frequentemente invadindo o convés do navio. A travessia pela tempestade durou até o dia seguinte e todos os navios mantiveram as suas posições.

Foto por George Guimarães
Bob Barker sofrendo o impacto das ondas

Foto por George Guimarães
Equipe do Deck trabalhando em meio à tempestade

No dia 18 de janeiro foi a vez do Steve Irwin tomar a frente no jogo. Um dos navios arpoeiros mostrou-se recuando no radar, provavelmente passando por alguma falha temporária e esse foi o momento para colocar em ação uma estratégia de evasão para que pudéssemos estar livres para buscar pelo navio-fábrica. O Bob Barker manteve a sua posição no rastro do navio-tanque enquanto o Steve Irwin acelerou para ultrapassá-lo, deixando-o para trás juntamente com o navio arpoeiro que apresentava alguma dificuldade. O outro navio arpoeiro escolheu ficar atrás do Bob Barker. 

Foto por George Guimarães
Sun Laurel sendo ultrapassado

A tempestade que se apresentava mais adiante foi escolhida para assegurar o sucesso da evasão. A diferença foi que a meteorologia indicava ventos com mais de 100 km/h para essa nova tempestade, que é a velocidade do vento de um furacão. Não há furacões nessa região do planeta porque os sistemas meteorológicos são desprovidos do calor necessário, mas a força do vento em tempestades como essa que se formava adiante é a mesma força do vento de um furacão.

Foto por George Guimarães
Onda lateral invade o convés do Steve Irwin

Foto por George Guimarães
Onda ergue a proa do Steve Irwin

Foto por George Guimarães
Ondas atingem a traseira do Steve Irwin

As ondas dessa vez chegavam a 15 metros de altura, as maiores encontradas durante toda a expedição. O navio se colocou de frente para as ondas, que a maneira mais confortável possível nessa situação onde a frequência das ondas é de 3 a 5 segundos. O fato de a onda ter 15 metros de altura não significa que elas cobrem o navio, pois ele se eleva junto com as ondas. O que isso significa é que a cada 5 segundos sofremos uma ascensão seguida de uma queda de até 10 metros. Por vezes, no entanto, dependendo da reação que a onda anterior provocou no navio, combinada com a direção da onda e outros fatores, ela pode sim invadir o navio. O convés era frequentemente inundado quando a proa, sem tempo para se elevar, se chocava diretamente contra uma onda. Em um único segundo, toneladas de água eram colocadas sobre o convés. Por vezes as janelas da Ponte de Comando eram atingidas pela água que subia com esse impacto.

Foto por George Guimarães
Onda invade o convés do Steve Irwin

Foto por George Guimarães
Ondas atingem a proa e espirra na Ponte de Comando

Foto por George Guimarães
Onda gigantesca pela traseira do Steve Irwin

A tempestade durou cerca de 12 horas, durante as quais seguimos adiante com a certeza de que esse risco nos garantiria a liberdade para continuarmos buscando pelo navio-fábrica. No dia seguinte, o Steve Irwin estava livre para voltar a rumar em direção ao sul para que assim possamos render de uma vez por todas a frota baleeira japonesa.

Foto por George Guimarães
Passada a tempestade

O Gojira, que varria o oceano mais ao sul, teve que retornar à Austrália para reparos no motor nos últimos dias, mas estará de volta em breve para retomar a busca. Tudo indica estarmos nos aproximando do navio-fábrica.

Durante esses dias mais ao norte, onde há um período curto de noite, tivemos a presença de uma linda Lua Cheia que iluminou a vastidão do oceano para ajudar nossos olhos, já desacostumados com a escuridão, a manterem-se atentos aos possíveis obstáculos. Mas tudo o que vimos por dias seguidos foi água. Hoje, já distantes da possibilidade da noite, voltamos a encontrar alguns growlers e icebergs pelo caminho.

Foto por George Guimarães
Lua Cheia iluminando o caminho

 
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